Excomunguemos
Excomunguemos a incoerência da sociedade que condena
Felicianos por homofobia e, ao mesmo tempo, Betos por respeito à diversidade. Excomunguemos
a hipocrisia de quem comunga e deseja o mal ao próximo. Os que vão à missa para
reparar a marca do sapato alheio. Os que não usam métodos contraceptivos e
colocam os filhos para pedir esmola no semáforo; os inconsequentes. Os que juram
amor no altar e agridem os cônjuges e filhos. Os homens que não respeitam as
mulheres; as mulheres que não respeitam os homens; os héteros que não respeitam
os homos; os homos que não respeitam os héteros. Excomunguemos homos e héteros.
Os que riem ou os que choram, os pobres ou ricos; os fracos ou fortes; apocalíticos
ou integrados; os de direita ou os de esquerda. Excomunguemos os que se dizem
de um lado ou de outro, porque a dicotomia é uma invenção. Excomunguemos os que
culpam os outros; os que não se responsabilizam por seus sonhos. Os que não
vieram para terem vida, e vida em abundância, mas para podar vidas. Os que
acham mais produtivo vigiar o trabalho alheio do que trabalhar. Os que derrubam
árvores para construir estacionamentos. Os que recriminam o português dos
outros, mas desconhecem o particípio oficial do verbo chegar. Os que atiram
pedras e não escovam os dentes. A marcha da família com Deus pela liberdade -
qual liberdade? O AI5 do século 21. Os que não se expressam e se escondem na
covardia da passividade. Ou, sei lá, excomunguemos os que se expressam, os que
discordam, pois esses não têm mesmo lugar no mundo. Excomunguemos os poetas e
toda a arte que revoluciona nas entrelinhas, nas entretintas. O cálice, o vinho
tinto de sangue. Excomunguemos tudo e não vai restar nada. Quem sabe assim o mundo
não se reinvente?
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