Não olhe para cima! (ou olhe, sim!!!)

Don’t look up! (Não olhe para cima!)

Eu até demorei um pouquinho para ver o filme (os amigos já estavam comentando), repleto de figurões vencedores do Oscar: Leonardo DiCaprio, Meryl Streep, Cate Blanchett, Jennifer Lawrence e mais.

O filme é uma sátira a presidentes estadunidenses, Trump em especial, e nele também reconhecemos nossas mazelas. O tema é dos mais atuais: o negacionismo científico com matizes de espetacularização política.

Sem falar muito sobre o enredo (que já tem bastante conteúdo na Internet), chamaram-me atenção alguns pontos em especial, pelo olhar da Psicanálise, que tem me acompanhado nos estudos como analista de discurso.

A personagem da estudante Kate Dibiasky (Lawrence), tachada de nervosa, inapropriada ou bipolar, é quem mais demonstra lucidez. É ela quem chama atenção da mídia espetacularizada sobre “nem todo assunto dever ser tratado com leveza”. O debate entre real e simbólico é antigo nas mais diversas teorias, de modo que, às vezes, é necessário, apenas, olhar e ver.

O cientista Dr. Randall Mindy (DiCaprio), em profundo ostracismo até a descoberta do Cometa pela estudante, luta por manter-se ético, porém, enquadrado por medicamentos “normalizantes” para “suportar a vida”, escorrega, tentando enxergar alguma razão onde não há. Parece ser a estudante, sem óculos embaçantes, elemento-chave para trazê-lo de volta “à luz”. Ela que era um vir-a-ser, caracterizada como “candidata ao doutorado”. Vir-a-ser que será a todos negado. 


Informação "com leveza". Tudo bem, só tem um enorme cometa em rota de colisão com a Terra

O filme é bem caricato, ainda assim, há quem possa não entender sua mensagem. “Será que existe mesmo um cometa” poderia ser substituído por “será que existe mesmo um vírus?”. O filme já estava sendo produzido antes da pandemia, de modo que os autores, ao perceberem as semelhanças, puderam incorporar alguns fatos e diálogos. Na narrativa hollywoodiana, enquanto os negacionistas berravam aos quatro ventos “Não olhe para cima!”, o grande cometa estava vindo de encontro à Terra. Mesmo quando já era visto como uma “estrela” a olho nu, dizia-se que “olhar para cima era ser marxista”. Quase literal. “Vai ver nem tem cometa.” Como se diz nos quadrinhos... Cabrum!

A própria ciência não é retratada como “dona da verdade”, mas necessária. Eis a questão: a ciência não é necessariamente confortante, não é “jornalismo light”, não é Pai de todos. Ela é a busca do “entendimento possível”, ressaltados seus procedimentos e métodos (análise empírica, avaliação por pares...). Por isso, a ciência não é a primeira a ser amada.

Amei muito a sátira aos algoritmos, esses, sim, acreditando “saber tudo” (nesse aspecto, anticientíficos), medições de sentimentos criadas por quem não os tem. Capitalismo, telefonia celular, vários outros elementos envolvidos. Note a previsão sobre “a morte do cientista”. “Os números não mentem”.

No fim, os safados escapam. Só que não.


Supermercado. A normalidade que se pode ter


Don’t look Up. EUA, 2021. Direção: Adam McKay Distribuição: Netflix

Imagens: Divulgação. 


Resenha por: 

Érika de Moraes, Dra. em Linguística, analista de Discurso

Instagram: @erikapoetika 


Comentários

  1. Textão, Érika! Obrigado pela análise.

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  2. Ótima análise! Não sabia que o filme já estava sendo produzido antes da pandemia... Caiu como uma luva né? kkkkk

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    Respostas
    1. Caiu mesmo como uma luva!! Obrigada por sua visita! Volte sempre para passear por aqui :)

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