CRÔNICA - Uma foto para registrar Chá Líquido
Já visitei algumas cidades imaginárias.
Com a aluna Karina, conheci Chá Líquido.
Espiei-a pela janela do trem e voltei para cá.
Afinal, amanhã tenho aulas com esses alunos criativos!
Profa. Érika
Com a aluna Karina, conheci Chá Líquido.
Espiei-a pela janela do trem e voltei para cá.
Afinal, amanhã tenho aulas com esses alunos criativos!
Profa. Érika
Uma foto para registrar Chá Líquido
por Karina Francisco
Era dezembro na cidade de Chá Líquido, Ana
estava caminhando pelas ruas a apreciar e fotografar os enfeites natalinos. Ela
ainda não se adaptara totalmente à nova cidade, em que todos estavam sempre correndo,
em busca do que comprar, do que consumir, do que fazer para ganhar dinheiro,
fugindo de compromissos profundos demais. Era muito frio se comparado a Ferra
Maciço, onde nascera. Mas ela tinha sua câmera, e com ela ficava horas
registrando seus pensamentos e sentimentos.
Ana continuou seu caminho, seu namorado
estava atrasado como sempre, parecia nunca se importar com horários,
compromissos ou qualquer assunto que demorasse muito a acabar. Ana não ligava,
achava engraçada essa aversão de seu namorado em se apegar a objetos ou
indivíduos. Ele era uma boa pessoa mesmo assim, valia uma foto.
Desistindo de esperar no frio, Ana entrou na
loja de sua mãe, que vendia quitutes e estava sempre cheia de ávidos
consumidores imediatistas e ansiosos por devorar as comidas tão gostosas do
lugar. Em meio a tantos gordinhos, Ana sempre se sentiu excluída, pois era
magrinha e ativa, constantemente correndo para lá e para cá, em busca de uma
boa fotografia.
Em sua escola, todos a achavam esquisita,
perguntavam se ela não tinha nada para se ocupar, ou o que estudar. Todos
estavam sempre apressados pelos corredores, mas corriam contra o tempo, pois
havia muita tarefa a ser feita. Ana sempre investia em sua felicidade e suas
fotos na antiga cidade. Tinha poucos amigos, os quais valorizava muito. As
pessoas ajudavam umas às outras e sempre havia trabalho para todos em Ferro
Maciço. Mas aqui, em Chá Líquido, as quantidades é que valiam, e ninguém
parecia realmente se importar com o outro, pois a competição é que regia as regras
da cidade.
Para ajudar sua mãe no movimento da loja, Ana
foi fazer uma entrega especial na casa de um cliente, e após tirar algumas
fotos com sua máquina, decidiu visitar seu pai na empresa onde tinha
começado a trabalhar, motivo pelo qual toda a família teve de se mudar.
A empresa era grandiosa e, sem ser notada,
Ana foi entrando. Mas seu pai estava ocupado demais para atendê-la, dizia a ela
que alguém precisava ganhar dinheiro. Ana achou esquisito, para ela seu pai já
tinha conseguido dinheiro demais em Chá Líquido, mas ele respondeu-lhe que
“ainda era pouco, sempre é pouco.”
Mesmo assim, Ana gostava da cidade. Via
oportunidades aos montes, outdoors sempre convidativos, muito entretenimento
agitando o município. O lazer e o descompromisso pareciam reinar. Porém, a
pressão era demais, seus pais e namorado queriam que ela se adaptasse, que
buscasse ascender profissionalmente, ganhar muito dinheiro e comprar tudo que
desejasse, além de largar a câmera, pois não havia futuro nela. Ana não
desejava comprar nada, apenas correr livre pelos campos com suas fotos, mas não
a deixavam.
Um dia, ao acordar, percebeu que sua máquina
havia sumido. Foi procurar e não encontrou nem suas fotos, que com tanto amor
arquivara. Desesperada, Ana começou a chorar, queria de volta sua câmera e seus
álbuns, os quais tinham sido todos vendidos, lhe disseram. Em uma insensata e
louca procura, ela andou a cidade toda, perguntou a todos que conhecia e não
encontrou nem vestígios. Ana tinha medo de se esquecer do que estava nas fotos,
sua antiga cidade e amigos, seus valores e felicidades.
Ana ficou sem rumo por um tempo, a andar no
meio dos apressados, sozinha e deprimida. Seus pais, para fazê-la ocupar a
cabeça, a matricularam na faculdade de Direito e em outros tantos projetos de trabalho.
Ana se atarefou tanto que não teve mais tempo para lembrar de sua câmera. Ela,
agora, tinha compromissos, aspirações, objetivos e nada do que viera ou fora
antigamente importava mais.
Ana cresceu e conseguiu tudo o que queria
desde que entrara na faculdade: casou, teve filhos, comprou casa e carro. E em
um belo dia, remexendo no porão, encontrou sua câmera e seus álbuns escondidos
embaixo do assoalho. Ao olhá-los, Ana gritou:
- Preciso de mais um saco de lixo aqui em
cima, por favor!
Orgulho dessa Menina... Opa!!! Dessa Mulhee, Karina Francisco.
ResponderExcluirOrgulho dos meus alunos!!! :)
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